Olá! Como estão as coisas por aí?
Talvez você tenha reparado que, ao longo da última semana, nosso site passou por algumas instabilidades. Pedimos desculpas pelo transtorno! Aqui do nosso lado, estamos reformulando o portal pra construir um grande ecossistema literário — e chega de spoiler. A espera vai valer a pena, prometemos! O site já voltou ao normal, mas, se você tiver qualquer dificuldade, é só dar um alô pra gente lá no berrante@aboio.com.br.
Ainda falando em novidades, queremos fazer uma brincadeira aqui na nossa news. As regras são simples: vamos propor um novo tema a cada semana e vocês escrevem alguma coisa a partir dele. Depois, é só compartilhar aqui nos comentários, porque o mais legal é a troca com as outras pessoas. Topam?
Nosso selo Cachalote é a inspiração para o primeiro tema: mergulho. Este episódio do podcast da
é um bom lugar pra pescar algumas ideias, e esta foto do Eduardo Gutierrez também é uma boa referência:Vale poesia, prosa, híbridos, formatos experimentais… Também não tem mínimo nem máximo de caracteres, o céu (ou o fundo do mar, no caso) é o limite. Divirtam-se!
🗞️ POR AÍ
Prefere os clubes de leitura aos de escrita? A escritora Thaís Campolina, mediadora do Leia Mulheres de Divinópolis e do Cidade Solitária, vai bater um papo com Cintia Brasileiro, autora de Na intimidade do silêncio, às 20h do dia 19 de junho. Para participar, basta preencher este formulário.
📚 PRÉ-VENDAS
O que está no forno pra você se deliciar! Lembrando que, ao comprar na pré-venda, você garante 10% de desconto, além de ter seu nome nos agradecimentos de todas as edições da obra.
Ninguém mexe comigo – até 09 de junho
Poeta, romancista e contista, Caio Girão é um autor versátil sem medo de se aventurar por diferentes gêneros. Tampouco sente medo de tabus – pelo contrário, mergulha em assuntos proibidos e tudo se torna matéria fértil para a sua literatura. Ninguém mexe comigo é a primeira coletânea de contos do “herdeiro da melhor contística das últimas décadas, realista como Rubem Fonseca e tão cortante quanto Marçal Aquino”, como define Joca Reiners Terron. Ah, e tem um tira-gosto lá no portal.
A Lança de Anhangá – até 09 de junho
Vencedor da edição de 2022 do Prêmio Literário Cidade de Manaus na categoria de contos, A Lança de Anhangá é o segundo livro de Ricardo Lima Kaate. O autor nos brinda com ficção científica, horror e fantasia ambientados no coração da Amazônia; mais do que mero cenário, porém, a floresta está viva e se torna uma personagem central nas histórias especulativas. Uma das narrativas está disponível no Portal Aboio.
não tatuo nomes – até 16 de junho
Colaboradora de longa data da Aboio, a poeta Samara Belchior lança seu novo livro pelo selo Cachalote. Em não tatuo nomes, as palavras se esparramam em diferentes direções, carregando signos e corpos para diferentes endereços e pessoas, nenhum deles nomeado. Na poética da autora, a experiência artística da palavra-corpo se torna uma criação conjunta dos destinatários possíveis e impossíveis. Se o fenômeno comunicativo tem um fim ou destino, o que ecoa como voz é a própria infinitude da linguagem de quem aprendeu a dedicar poemas.
caminho de volta – até 21 de junho
Ruptura: espaço de falta e de encaixe. No desmonte de objetos-vivência, Claudine Delgado redimensiona o olhar poético para a remontagem dos sossegos e das compulsões. Como em um bricoleur, nas palavras da própria autora. Em caminho de volta, o retorno não é nunca para o ponto de partida. E mesmo que possa ser, o leitor que preencher as lacunas deixadas pela autora – com os fragmentos da própria vida, quem sabe – terá diante de si uma descoberta: início, percurso e regresso são divisões limitadas para quem se dispõe a provar com os olhos.
dentes de leite – até 23 de junho
Nem sempre a violência é visível. Talvez tenhamos experimentado as primeiras e fundantes antes da palavra. Antonio Pokrywiecki não foge das perturbações de seus personagens, sem incidir no espetáculo empurrado pela linguagem. Em sua estreia na contística, Antonio Pokrywiecki percorre — com propósito e, quando quer, com maldade — a ambiguidade dos signos do medo e do trauma. A imprevisibilidade que assombra pode ser tão assustadora quanto os próprios monstros. E os monstros também não fogem. Mas podem ser provisórios.
trote – até 23 de junho
“Existe um ser que mora dentro de mim como se fosse a casa dele, e é”. As palavras de Clarice Lispector, celebrada na epígrafe de trote, oferecem um caminho para entrar na casa que Jheferson Rosa construiu com a argamassa dos versos. Armado de silêncios e outras violências, o autor joga com imagens concretas para expressar o que se convencionou chamar de história. Casa – lugar e ideia – não é para o autor um dado definido. Casa é trânsito e, nos poemas deste livro, sentimos como se estivéssemos tateando paredes antes de existirem os próprios cômodos. A segurança de alguns toques é testemunho tanto do conforto de um lar quanto da possibilidade do engano. trote nesse sentido é ambicioso: prefere a ranhura e não tranca portas para esconder corpos ou vozes.
Grosswords — até 23 de junho
Marcelo Gross, nome indiscutível na lista das grandes figuras do rock brasileiro, reúne pela primeira vez todas suas composições em um único lugar. Grosswords é uma viagem por mais de duas décadas de seu trabalho, num passeio que começa com a fundação da banda Cachorro Grande, até seu último álbum solo: Exilado. Além disso, o livro contém quatro letras inéditas.
Apresentado por Paulo Miklos e organizado pelo jornalista Saulo Marino, este compilado celebra um dos acordes mais marcantes do rock gaúcho, que estourou em todo o Brasil. Parte do dinheiro da venda será revertida para a reconstrução da Livraria Taverna em Porto Alegre.
A fenda da lagoa — até 10 de julho
O bairro do Pinheiro, onde Lili Buarque nasceu e cresceu em Maceió, já não existe mais. O palco de sua juventude deu lugar a escombros e rachaduras, o solo afundado após décadas de extração irregular de sal-gema na cidade. E a ameaça iminente das histórias das cerca de 200 mil pessoas afetadas caírem no esquecimento. As crônicas de A fenda da lagoa são um registro da vida que pulsava pelo bairro antes de o chão tremer naquele 3 de março de 2018. Passeamos pelas memórias da autora em textos ora melancólicos, ora divertidos — muitas vezes, os dois. Ao longo dessa excursão, vamos desvendando o que há por baixo das casas e negócios evacuados à força.
Encerramos a news por aqui, mas estamos ansiosos pra ler o que vocês escreverem sobre mergulho!
Até a próxima,
Equipe Aboio
..." ele pôde dar-se o gosto de ver os incrédulos contemplando, com a boca aberta, o maior transatlântico deste mundo e do outro, encalhado diante da igreja, mais branco que tudo, vinte vezes mais alto que a torre, e mais ou menos noventa e sete vezes maior que o povoado, com o nome gravado em letras de ferro, halalcsillag, e ainda gotejando pelos lados as águas antigas e lânguidas dos mares da morte".
(García Márquez)
Assombrada pelo Titanic há alguns dias, desde que li o conto “A última viagem do navio fantasma”, de Gabriel García Márquez.
Me dei conta de que os naufrágios me atemorizam. Com a leitura, fui transportada de volta ao Porto de Santo Antônio, em Fernando de Noronha, onde, no ano passado e pela primeira vez, mergulhei para conhecer os restos mortais de uma embarcação.
O Maria Stathatos aportou na maior ilha do arquipélago em junho de 1937 (ano de nascimento de outra Maria, minha mãe), quando foi consumido pelas chamas de causa desconhecida. Os tripulantes abandonaram o convés à noite, resgatados por um navio alemão, enquanto o vapor grego queimava até às ferragens e afundava para sempre em águas brasileiras.
A carcaça de aço está a uns cinco metros de profundidade. É fácil, com a limpidez do mar de Noronha, visualizá-la, ainda sólida e recoberta de líquens, sem que seja preciso mergulhar, o que facilitou minha vida de sereia fajuta.
O sobrevoo líquido sobre aquele esqueleto me deu calafrios. A curiosidade cedeu à angustia. Não tinha ideia, até o encontro, que a cena me remeteria a sentimentos desoladores. A decrepitude e o abandono do Maria emergiram meus fantasmas.
Não me esforcei para chegar mais perto. Permaneci à superfície e observei, de óculos de mergulho, aquela monstra morta debaixo de mim apenas por alguns minutos. Foi o bastante. Decidida, bati os pés em retirada com a força que me foi capaz, pois intuí que dessa fuga dependia minha sobrevivência. Precisava ir para o mais longe possível da presença do casco afogado.
O pavor de submergir é muito humano. Ou talvez muito símio, uma vez que os macacos também não têm muito apreço pelas aventuras molhadas. Parece um paradoxo não saber nadar de forma instintiva, se experimentamos nove meses de vida aquática antes de nos tornarmos terrestres. Mas do desconforto em relação aos navios afundados, não fazia caso até me deparar com um deles fora das telas do cinema.
Cara a cara com o Maria, senti uma espécie de vórtice a me atrair para aquele esquife oceânico. Nem a possibilidade de me transformar num exótico coral habitado por peixes multicoloridos apaziguou o temor pelo fundo do mar, pela fossa abissal que é ter pulmões num ambiente de guelras.
A distância da areia da praia, a descomunal diferença entre a estrutura do navio e a estrutura do meu corpo, os gritos dos afogados ancestrais, a densidade monumental do Atlântico: tudo, de súbito, era âncora a me levar ao fundo. Escapei por pouco de sucumbir aos apelos das sirenas.
Há muitos anos eu não imergia na escrita de Gabo. Percebo que todo autor tem suas obsessões estilísticas e temáticas. Escreve-se mais do mesmo em cada conto, romance ou crônica, mesmo que de forma magistral. Não há nessa afirmação uma crítica, apenas a constatação da identidade de quem cria.
E, sem saber se os assuntos nos escolhem ou se somos escolhidos por eles, após o conto mágico de Gabo, leio a curiosa notícia sobre um hotel na Namíbia que se inspirou em réplicas de naufrágios e anda fazendo sucesso. Eu hein, não pagaria um real pela hospedagem.
Luciana Assunção lulupisces.blogspot.com